segunda-feira, 25 de abril de 2016

Difícil entender o silêncio sobre Cunha

A "seletividade" tem estado em alta. É tanta gente falando sobre esta palavra e suas derivações, mas parece que palavras se vão conforme o vento bate. E acabam por não surtir, muitas vezes, o efeito que deveriam: fazer as pessoas refletirem.

A "reflexão" me parece pouco utilizada em um momento de polarização política e efervescência do cenário político-econômico. As paixões estão mais exacerbadas do que a capacidade crítica. É a minha impressão.

Bem, digo isto porque independentemente de ser a favor ou contra o processo de impeachment de Dilma Rousseff, precisamos refletir sobre o que está acontecendo no Legislativo nacional. O esforço vai valer à pena. Garanto! E ainda podem "rolar" sons interessantes de panelas batendo... Ou outros protestos, conforme o gosto do manifestante.

O que não pode continuar é este silêncio sepulcral com
Eduardo Cunha (PMDB-RJ) segue tranquilo à frente da Câmara.
 Foto de Miguel Schincariol/AFP
relação ao processo de cassação do deputado Eduardo Cunha. Silêncio vindo dos grupos que apoiam o impedimento de Dilma Rousseff – é preciso dizer. O que tenho notado nas ruas é que somente quem é contra o impeachment de Dilma faz protesto contra Cunha. Não dá para ser assim. 


Se há algo que pode verdadeiramente unir o país é a luta contra a corrupção. Nenhuma cidadã e nenhum cidadão que paga seus impostos e necessita dos serviços públicos é a favor da roubalheira. Os desvios de milhões, de bilhões de reais fazem muita falta na Saúde, na Educação, no saneamento básico, na melhoria das condições de vida da população. Bem, neste raciocínio, se a bandeira é contra a corrupção, o número um na lista dos que devem ser cassados é justamente Eduardo Cunha. 

O prazo regimental para que o processo de Cunha (réu, mas presidente da Câmara dos Deputados) seja julgado terminou em 22 de abril. Segundo o regimento da Câmara, em 90 dias úteis ele deveria ser declarado culpado ou inocente por ter mentido na CPI da Petrobras. Ocasião na qual ele afirmou que não possuía contas no exterior. Isto ocorreu em março do ano passado! No entanto, o que se descobriu foi uma "pequena" fortuna de alguns milhões de dólares na Suíça. 

Dinheiro, segundo as investigações, proveniente de propina da Petrobras. Vejam: não há indícios de crime. Há provas incontestáveis de crime. Mas... as coisas não têm caminhado como deveriam.

Além da morosidade nos trabalhos, correm recursos de anulação do processo de cassação de Eduardo Cunha na Comissão de Constituição e Justiça da Casa. Esta semana a CCJ deve começar a funcionar e se debruçar sobre esses recursos. Há cotações para que o presidente dessa comissão seja um aliado de Cunha. Todas as decisões que envolvem a CCJ devem atrasar ainda mais a tramitação do processo de cassação do deputado.

Caso a CCJ não acate os recursos, Eduardo Cunha promete entrar com novos pedidos de anulação, de suspensão de atos praticados no decorrer do processo e ainda ameaça recorrer à Suprema Corte. 

Com um grupo maciço de apoiadores na Casa, Eduardo Cunha segue intocável à frente da Câmara. Não é possível, repito, que haja esse silêncio absurdo quanto à permanência dele no Legislativo. 

Há, ainda, especulações sobre um possível acordo para que a CCJ não acate os recursos e o processo caminhe para a aplicação de uma pena mais branda que a cassação. Outros rumores sugerem a possibilidade de "erros" estarem sendo realizados propositalmente para facilitar a anulação de todo o processo. Bem, aguardemos os próximos capítulos... 

Se não houver pressão da sociedade, Cunha tem grandes chances de sair ileso e até inocentado de todo esse processo. Vamos fazer o favor de botar o bloco na rua? Ele deixar de conduzir a Câmara e se tornar inelegível pelos próximos oito anos é o mínimo que devemos exigir. Por uma questão de  ética e de coerência, panelas deveriam bater pela sua saída do poder público. Camisas verde e amarelas deveriam ser vestidas também contra a sua permanência no cenário político brasileiro.

Cronologia

A Folha de São Paulo publicou uma cronologia bastante resumida, mas bem esclarecedora, sobre as tentativas – até agora muito bem sucedidas – de atrasar o processo.

Cunha na Lava Jato e no Conselho de Ética

3.mar.15
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, envia ao STF 28 pedidos de abertura de inquérito contra políticos, inclusive Cunha

12.mar.15
Em depoimento à CPI da Petrobras, Cunha nega ter contas no exterior

16.jul.15
O lobista Julio Camargo, delator da Lava Jato, diz que Cunha recebeu US$ 5 milhões em propina

20.ago.15
Procuradoria-Geral denuncia Cunha por lavagem de dinheiro e corrupção

30.set.15
Suíça envia ao Brasil dados de quatro contas secretas de Cunha que teriam recebido propina

13.out.15
Pedido de cassação contra Cunha, de autoria de PSOL e Rede, é protocolado no Conselho de Ética

28.out.15
Mesa numera o pedido e o envia ao conselho, o que foi feito no prazo máximo de três sessões

3.nov.15
Processo é instalado, e Fausto Pinato (PRB-SP) é escolhido relator

19.nov.15
Com a ajuda de aliados, Cunha consegue suspender reunião do conselho que analisaria o parecer

24.nov.15
Defesa de Cunha pede o afastamento de Pinato da relatoria; sessão no conselho é mais uma vez suspensa

9.dez.15
Cunha consegue destituir Pinato; Marcos Rogério (PDT-RO) é escolhido novo relator

15.dez.15
Parecer de Rogério pela continuidade do processo é aprovado por 11 votos a 9. No mesmo dia, Cunha é alvo de fase da Lava Jato

16.dez.15
Procuradoria pede o afastamento de Cunha, que estaria obstruindo investigações

2.fev.16
Waldir Maranhão (PP-MA), vice da Casa e aliado de Cunha, anula sessão em que parecer foi aprovado

2.mar.16
Novamente, conselho aprova parecer pela continuidade do processo, por 11 votos a 10

3.mar.16
STF aceita a denúncia e Cunha se torna réu; Janot o denuncia pela segunda vez, agora por contas na Suíça

19.abr.16
Maranhão anuncia restrições ao conselho, que só poderá analisar se Cunha mentiu ou não à CPI



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